26 de jan. de 2010

Amor com Escalas


O QUE FAZ UM FILME ser especial? A sintonia do elenco, a competência da direção, a subversão do roteiro, o compasso e descompasso da trilha sonora?

Na minha opinião todas as alternativas anteriores, acrescidas de outra fundamental: a presença de um ator/atriz que roube a cena. Nisso, 'Up in the Air' (traduzido por aqui bisonhamente como 'Amor sem Escalas') está muito bem servido. Além das presenças brilhantes da veterana Vera Farmiga (linda como nunca, charmosa como sempre) e Anna Kendrick (uma indicação de melhor atriz coadjuvante não seria surpresa), o filme traz um George Clooney em estado de graça.

Completamente à vontade no papel do coroa sedutor e "bem resolvido", Clooney ganha, com a direção arrojada e roteiro agridoce do filme, carta branca para desfilar suas inúmeras qualidades. Com a naturalidade dos grandes, o ator cativa o público a cada passagem, levando os espectadores não apenas a observarem, mas sentirem profundamente as transformações na vida de seu personagem.


A história é muito mais complexa do que se apresenta nas sinopses que você lê por aí:

"Ryan Bingham tem por função viajar pelo país e demitir pessoas. Ele está muito feliz com seu trabalho, até que seu chefe contrata uma nova funcionária jovem e arrogante, que põe em risco seu emprego. Ele passa então a tentar convencê-la do grande erro que é o programa, viajando com ela para mostrar a realidade de seu trabalho".

Bah, isso é tão esdrúxulo e minimalista quanto dizer que Senhor dos Anéis é a saga de um hobbit para destruir um anel maligno que está prestes a acabar com tudo que é bom no planeta. Ora!

"Amor sem Escalas" (urgh!) é um filme de camadas. Com a recente crise norte-americana como toalha de mesa, ele vai oferecendo, ao longo de suas quase duas horas, pratos variados e extremamente apetitosos. Temos aqui as relações sem comprometimento, as famílias desestruturadas, a total despersonalização das relações causadas pelo uso desmedido da internet, a dificuldade em aceitar uma demissão, o individualismo da sociedade norte-americana e um pout-pourri de desilusões causadas por falsas expectativas criadas.


Ryan Bingham, que além de trabalhar demitindo funcionários viaja pelo país dando palestras que ensinam "como esvaziar sua mala e tornar sua vida mais leve, prática e feliz", é o retrato do homem moderno. Qualificado, vaidoso, competente, cool. Mas com imensas dificuldades de criar raízes e se ligar a pessoas, por puro medo de perdê-las e se magoar. O descaso de Ryan com sua casa (que mais parece um quarto de hotel) é tão grande que ele passa apenas 42 dias por ano nela; sua indiferença em relação à família é tamanha que ele nem sequer conhece o novo cunhado, que está prestes a se casar com a irmã caçula.

Já Alex Goran (Vera Farmiga) simboliza a mulher do século XXI. Auto-proclamada um Ryan Bingham de vagina, ela topa de cara um romance cama, laptop e banho, com uma independência e auto-suficiência que deixam Bingham - e qualquer espectador (de pinto) assustado. Afinal de contas, qual homem não deseja das profundezas de sua alma que a mulher seja carente, afetuosa e submissa?

É com um espelho feminino que Ryan se dá conta de que, no fundo, é muito mais legal ir a viagens - e festas de família - acompanhado. E é na fragilidade emocional da nova funcionária (Anna Kendrick) que ele vê desperto seu empoeirado instinto paternal, eclipsado por seu estilo de vida prático e desancorado.


Não poderia deixar de citar aqui o belo trabalho de Jason Reitman, tranquilamente o diretor mais lúcido de Hollywood. Assim como em "Obrigado por Fumar" e "Juno", Reitman transborda frescor e naturalidade tanto na direção do elenco quanto no roteiro, seguramente o próximo vencedor da categoria de Melhor Roteiro Adaptado (do livro de Walter Kim).

Os diálogos do filme são simplesmente deliciosos, cada fala tem uma razão de ser. A trilha sonora embala suavemente o desenvolvimento do enredo, indo das nuvens ao fundo do poço de forma concisa e oportunamente velada.

Algumas passagens beiram a perfeição, justamente por tratarem de forma tão honesta as imperfeições da vida. E no centro de cada uma delas lá está George Clooney: lindíssimo, experiente, seguro, e surpresa: imperfeito. Como toda vida (real) deve ser.



Trailerz:








2 comentários:

MJ disse...

George Clooney rocks my world!!!

Kookie disse...

Estou louca pra ver esse filme, depois da sua crítica favorável, então, deu mais vontade ainda.
Fora que o George Clooney é um gostoooso!!!!

bjs,

Kookie.

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